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27 de janeiro de 2012

Limites - Parte III - Agressividade e maldade

Do Último Segundo:

O limite da maldade infantil

Porque as crianças com comportamento problemático e consistentemente agressivo devem ser observadas de perto pelos pais

Kevin era uma criança estranha e sua mãe, Eva, sempre soube que faltava algo ao menino. O filho jamais demonstrou afeto por ela. Tinha atitudes cruéis e gostava de subjugá-la dia após dia. Influenciada pela omissão do pai, Eva jamais consegue encarar o problema do menino. O resultado é uma tragédia – além de uma mãe se sentindo constantemente culpada pelas atitudes do filho. Ficção ou verdade? Neste caso, trata-se de um filme: “Precisamos Falar Sobre o Kevin”, estrelado por Tilda Swinton, John C. Reilly e Ezra Miller, com estreia hoje no Brasil. Mas ao assisti-lo, angustiante do início ao fim, é impossível a uma mãe não se perguntar: e se fosse o filho da vizinha ao lado? Ou mesmo meu filho?

Foto: Divulgação
Eva e Kevin: culpa impede a mãe de reconhecer o problema do filho
É possível distinguir uma maldade infantil natural, típica da idade, de um sério distúrbio que pode resultar em um comportamento psicopata. Mas detectar esse distúrbio é delicado e os pais devem levar em consideração diversos fatores. “Se juntarmos repetição de um comportamento agressivo ou maldoso sem motivo aparente; generalizado, ou seja, a criança não é agressiva apenas na escola ou em casa; ausência de arrependimento e culpa; falta de afetividade; dificuldade de lidar com frustrações e total falta de empatia com o sofrimento alheio, temos fortes indicativos de que tem algo errado com a criança”, enumera Ana Beatriz Barbosa Silva, médica psiquiatra e autora de “Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado” (Editora Objetiva).












Afeto
A falta de afetividade na infância é um dos indicativos mais preocupantes. As crianças tendem a ser naturalmente encantadas com seus pais. Já para quem tem transtorno de conduta isso não vem de forma tão natural. Na verdade, o afeto gratuito – ou seja, sem que a criança ganhe algo em troca, como um brinquedo ou um doce – é praticamente inexistente.


A idade também é fator importante na equação. “O comportamento agressivo apresentado por uma criança de três anos não tem o mesmo significado do apresentado aos nove ou 10 anos. A etapa de desenvolvimento das faixas etárias é diferente”, afirma a médica psiquiatra da infância e juventude Tatiana Assumpção.Outro sinal é o gosto pelo sofrimento, seja de outra pessoa ou de um animal. “Se você tem um filho com 10 anos que continua fazendo xixi na cama – a enurese noturna tardia é apontada por muitos especialistas como um dos sinais da presença de transtorno de conduta – e mata filhotes de animais significa que ele vai se tornar um psicopata quando for adulto? Não, mas significa que ele não está bem”, alerta Ilana Casoy, especialista em Criminologia e escritora.

Tatiana ressalta que uma criança não pode ser diagnosticada como psicopata. O termo correto para os menores de 18 anos é transtorno de conduta ou de personalidade. Isso porque as crianças não têm a personalidade totalmente formada e a condição ainda pode ser minimizada.
Mesmo com tantos sinais, não é fácil reconhecer em seu filho uma criança com distúrbios que podem levar a uma psicopatia na vida adulta. A dificuldade, que segundo especialistas é mais latente nas mães do que nos pais, pode tirar da criança a possibilidade de uma vida em sociedade mais harmoniosa.
Consequências

Essa vida mais próxima do que muitos consideram normal pode ser possível através de um trabalho de contenção de impulsos. A criança precisa aprender desde cedo que suas atitudes podem trazer sérias consequências. Para acostumá-la com essa noção do que pode e o que não pode é preciso que os pais sejam rígidos e não amoleçam durante o processo. “Tirar coisas de que a criança gosta é o caminho mais indicado na infância. Mas não pode deixar brincar com o videogame só um pouquinho. Tirar significa tirar mesmo. Precisa ser firme”, afirma Ana Beatriz.
Quando esse esforço é feito precocemente, a criança vai aprender que não pode quebrar algumas regras porque dessa forma vai se prejudicar. O sentimento do outro continua não sendo importante, mas pelo menos ela não sofrerá perdas. “Essas crianças não têm alteração intelectual ou cognitiva. O que falta mesmo é a empatia pelo outro. O problema da perversidade não é a inteligência, e sim a falta de afetividade”, diz Ana Beatriz.
Aos pais que tentam conter uma perversidade excessiva de seus filhos resta lembrar que ninguém vai conseguir ensiná-los a amar. O que se pode fazer é moldá-los de tal forma que tenham medo de desrespeitar as regras da convivência em sociedade. Ana Beatriz esclarece que a perversidade não é apenas matar, e sim não ter empatia. “Estima-se que 4% da população mundial sofra com esse transtorno, sendo 3% leves e moderados que não matam ninguém. Inclusive eles podem ser até bem sucedidos em diversas áreas de sua vida”.


Leia também:

Limites - Parte I - Amor e disciplina

Limites - Parte II - Pais sem autoridade

Limites - Parte III - Agressividade e maldade

Limites - Parte IV - Ausência deles e consequências

Limites - Parte V - Um pouco de ordem

Limites - Parte VI - Quando os pais também precisam

Limites - Parte VII - O que as escolas têm que saber sobre a juventude

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